Annabelle 3: a maldição do terceiro filme persiste.

Os bons filmes da franquia Invocação do Mal mostraram que o terror pode ser feito de forma coerente e agradável aos fãs do gênero. O primeiro Annabelle não surpreendeu, mas também não decepcionou e, então, o segundo filme da boneca amaldiçoada chegou e agradou boa parte do público, conseguindo alta arrecadação para um filme de terror no ano de seu lançamento.

Apesar do fraco A Freira, os filmes “interligados” da série Invocação do Mal dão lucro, apesar dos investimentos nem sempre altos. Logo, nada mais justo do que pensar que um terceiro filme da série Annabelle teria algo a mais para cativar e fazer novamente um boa bilheteria.

Infelizmente, a fórmula não deu tão certo nesta nova empreitada…

Como fã de filmes de terror que já assistiu dezenas de filmes do gênero, obviamente que muito do que é lançado acaba se tornando “mais do mesmo”. O que me surpreende é o desvio da rota traçada que gerou lucros e boas críticas em obras como os dois Invocação do Mal e em Annabelle 2: A Criação do Mal. Ainda não consigo compreender como algo com tanto potencial chegou ao ponto de se mostrar tão raso. E não faço esse comentário com alegria: eu realmente queria muito que Annabelle 3: De Volta para Casa fosse ótimo.

Antes que os fãs mais exaltados me apedrejem, deixem-me detalhar os pontos altos e baixos da produção.

A história…

O começo do filme é bem promissor ao mostrar uma parcela do poder da boneca Annabelle, responsável por atrair os mortos. As cenas são bem interessantes e provocam tensão e medo nos espectadores. Nesse começo compreendemos como a boneca chegou à famosa estante de vidro onde, teoricamente, sua influência negativa estaria anulada.

A partir daí passa-se um bom tempo e nos deparamos com a família de especialistas em sobrenatural Ed (Patrick Wilson) e Lorraine Warren (Vera Farmiga) que seguiram suas vidas ao lado da jovem filha do casal, Judy (Mckenna Grace). Judy dá indícios logo em sua primeira aparição de ter mais do que o sangue da mãe, já que ela parece ter também sua força sensitiva.

O casal precisa ficar fora e resolve colocar a jovem Mary (Madison Iseman) para ser a babá de sua filha. Mary é a irmã de um dos garotos que atormentam a vida de Judy apenas por ela ser filha dos Warren. Ainda que parentes, a bela Mary não tem a mesma índole do irmão.

Entre a saída dos pais de Judy e o início do trabalho como babá, Mary é forçada por uma amiga a convidá-la para uma singela festa surpresa pelo aniversário de Judy. O problema está na descrença aparente dessa amiga chamada Daniela (Katie Sarife) que também esconde algo sobre si mesma.

E é a partir daí que os ótimos resultados obtidos em Annabelle 2 desabam…

Inconsequência.

* ATENÇÃO: a partir deste ponto há SPOILERS!!!!

Mesmo o mais descrente dos mortais não irá brincar com o sobrenatural. É da índole humana não desafiar aquilo que desconhece, mas parece que essa regra não se aplica à jovem Daniela. Após conseguir o “convite” para a festa de Judy (uma menina absolutamente sem amigos), Daniela faz o impossível para permanecer sozinha na casa mais temida de toda a vizinhança.

Bem, apesar do esforço para parecer natural, os subterfúgios usados pelo roteirista Gary Dauberman não são suficientes para dar credibilidade aos fatos. Claro que a garota consegue encontrar um dos itens mais perigosos da casa e, com ele, adentrar ao quarto mais perigoso do mundo. Mas isso não é o suficiente para assustá-la. A mistura de destemor com curiosidade só poderia resultar em tragédia… ou não.

Medo?

Há boas cenas neste filme. Há muito potencial. Mas é fato que muito disso foi descartado por conta de assustar ao invés de sugerir. O longa avança no típico erro do exagero para gerar medo; isso poderia ter sido evitado com a premissa do menos é mais.

Duas cenas são realmente muito boas: o surgimento de uma noiva macabra e a sequência das moedas. Caso assistam, certamente compreenderão sobre o que estou falando.

Fora essas duas cenas, honestamente, o filme fica apenas na tentativa de impor o suspense que não convence.

Economia exagerada?

Não me preocupei em pesquisar o orçamento do filme. O certo é que houve economia ao propor um longa que se passa quase que integralmente em uma residência. Ok, estamos falando da residência do casal Warren, o que não significa que isso por si só seja assustador. E é claro que um filme com antecedentes como os dois Invocação do Mal e Annabelle 2 deveria ser assustador.

Para complicar ainda mais, o roteiro propõe a inserção de um garoto como alívio cômico. Sinceramente, não suporto mais filmes que se propõem a ser algo e amenizam isso por conta de uma censura mais alta ou atração de um público mais jovem. Quer ser um filme de terror? Então provoque medo e suspense em doses massivas. Tal como em uma montanha-russa, o filme de terror não pode dar tempo para que o público respire e se sinta mais tranquilo.

Uma noite no Museu.

O quarto proibido dos Warren é quase um museu de horror. Há relíquias macabras e amaldiçoadas que estão protegidas por várias fechaduras e uma porta bem resistente (além de várias sessões de purificação com água benta).  Neste local que deveria ser protegido em tempo integral, uma jovem desconhecida entra, consegue abrir o local e faz um tour pelo museu de horrores. Claro que ela não perderia por nada a oportunidade de tocar em tudo.

Esse é um momento que já indica que teremos ao menos uma morte, pois os objetos e relíquias são possuidores de grandes poderes e capazes de perpetrar o mal em diversas formas. Esse seria o ponto ideal para vermos mortes, criaturas grotescas e uma maximização dos poderes malignos da boneca, porém novamente o roteiro peca ao minimizar os efeitos desse erro fatídico cometido por Daniela.

E por falar em fatalidades.

Chegamos ao ponto mais sombrio do filme: tudo foi direcionado para um final feliz. Vejam, se houve um caos absoluto no segundo longa da série, medos convincentes e mortes apenas com a presença de Annabelle, qual seria a perspectiva do espectador para essa terceira obra? Certamente mais mortes, medo e dores provocadas pelas perdas e dramas das personagens. Isso não acontece em momento algum. Daniela, a garota responsável pelo despertar de quase meia dúzia de demônios, muda de índole gradualmente durante o filme; Judy se mostra uma corajosa paranormal, enquanto a babá Mary sofre os diabos sem sequelas aparentes.

E é aí que chegamos ao ponto máximo do desperdício de dinheiro e potencial: o final é pleno de felicidade, companheirismo e redenção. Após obras como Nós, Corra, It e os já citados Invocação do Mal 1 e 2 e Annabelle 2, o mínimo que o diretor Gary Dauberman poderia entregar é algo incômodo, assustador e marcante.

É com pesar que afirmo que esse é o mais fraco filme do universo expandido de Invocação do Mal.  Essa é a única fatalidade desse longa-metragem…

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