Crítica: A Queda

Antes de falar do filme em si, queria fazer umas comparações de altura para tentar situar o drama cinematográfico que comentarei em breve. A Torre Eiffel, símbolo de Paris, tem 300 metros de altura, a Estátua da Liberdade, ponto turístico de Nova Iorque, tem 93 metros de altura, nosso Cristo Redentor tem 38 metros, mas o Morro do Corcovado, que o carrega, tem 700 metros, o hoje destruído por ataques terroristas em 2001, Word Trade Center tinha 417 metros, o prédio mais alto do mundo, o Burj Khalifa, em Dubai, tem 828 metros e, sendo bairrista, o prédio mais alto de Porto Alegre tem quase 100 metros. Enfim, essas comparações de altura servem para explicar o drama que as amigas Becky e Hunter, alpinistas acostumadas à adrenalina passam no filme A Queda (Fall, 2022), de Scott Mann, que estreia nessa semana nos cinemas.

A Queda no começo nos apresenta uma amostra do que as duas e mais o marido de Becky, Dan, faziam escalando rochas e pedras íngremes, mas são abaladas por um acidente fatal com o rapaz. Becky não se conforma com a perda, entra pra dentro da garrafa, não esquece o falecido companheiro e se afasta da família e amigos. Um ano depois do acidente, Hunter, sua amiga e testemunha do fatal acidente, resolve procurar Becky e propõe um novo desafio: as duas subirem em uma das torres de televisão (no caso, abandonada no deserto) mais altas dos Estados Unidos, a desativada antena da B67 TV, que subindo para o céu tem a altura de 610 metros. O que parecia ser apenas uma aventura libertadora para as duas experientes alpinistas se torna um drama ao chegar no topo, já que as estruturas antigas e malconservadas da torre fazem derrubar as escadas de acesso a ela e as duas ficam presas há mais de 600 metros, com apenas 15 metros de cordas, sem sinal de celular, sem tênis, sem água e comida e vigiadas constantemente por famintos abutres, restando às duas uma luta insana por sobrevivência nas alturas.

Scott Mann, com um roteiro dele mesmo e de Jonathan Frank, simplesmente realizaram o melhor filme de terror, ou melhor, de luta pela sobrevivência em muito tempo no cinema. Mexendo com o medo óbvio da maioria dos seres humanos ditos normais com a altura, o filme é de uma tensão inebriante da metade do filme até o fim, onde é quase impossível piscar, tamanho o drama das duas moças isoladas 600 metros acima do chão. As tomadas aéreas do filme, as terrestres, as que ele faz a léguas de distância, só enaltecem a gigantesca torre e o quanto as duas estão numa enrascada mortal e quase sem saída. Tomadas aéreas vertiginosas, a construção do suspense, quando notamos que os parafusos começam a se soltar das escadas, as quebras de degraus, todo o clímax, por mais clichê que possa parecer, dá um frio na barriga, porque sabemos que as duas logo saíram da euforia da conquista e de vencer os medos para uma prisão minúscula e em uma altura que deixaria qualquer um desesperado. O acerto principal do diretor foi criar essa cama de suspense para descambar no dito drama de Becky e Hunter. Claro que as duas, sendo alpinistas, ainda buscam saídas para tentar algo para salvá-las, o celular dentro do tênis, a descida de Hunter até a antena com apenas 15 metros de corda, as tentativas de resgatar a bolsa com água e o drone que pode salvá-las, os bandidos que até as veem no alto, mas acabam ignorando-as, além é claro, dos famintos abutres, ávidos por carniça e carne e, aproveitando o seu habitat aéreo, sabem que as duas podem ser devoradas. Um show de tensão, pânico, erros e tudo com 610 metros de altura para apavorar mais ainda o espectador.

Quanto às atuações, o filme é das duas atrizes. Grace Caroline Currey, como a calejada Becky, que ainda não se curou de seus traumas com a morte do marido e a relação conflituosa com o pai, está muito bem como a garota que precisa vencer seus medos e dar um sentido para sua sobrevivência, e no filme, nada como uma torre de 600 metros para ser a deixa para vencer seus traumas. Virginia Gardner, como a corajosa e manipuladora Hunter, está melhor ainda, fazendo o papel da popstar da adrenalina, mais preocupada com os likes que com a vida, mas sempre positiva, mesmo sabendo que está no topo de uma torre cercada por ameaças de tudo que é lado, não perde a pose nunca.

A Queda é um show de imagens, com tomadas sensacionais, mostrando a grandiosidade da antena, aliás, além da dupla de atrizes, a antena é uma atriz à parte do filme, é mostrada de todos os ângulos possíveis, por baixo, por cima, de longe, na perspectiva das garotas, tudo para exemplificar o quanto era a bronca em que Becky e Hunter se meteram. Além de ser um suspense de primeira, um thriller de sobrevivência, de luta para vencer seus medos e traumas, a importância da amizade e de quanto o ser humano pode ser forte em situações adversas e perigosas. Efeitos especiais de primeira, o filme teve como base para a gravação uma torre de 30 metros, e destaque para as duas atrizes que fizeram tudo sem dublês, contando com suas habilidades. A trilha sonora também tem um papel fundamental na construção do suspense, deixando o que já era tenso em algo perturbador, pois sofremos junto com a situação absurda em que as meninas se encontram. Enfim, A Queda já é um dos melhores filmes do gênero nesse ano de 2022, e sugiro assisti-lo numa tela de cinema, onde a tensão vai ser extremamente maior, mas não aconselho a quem tem acrofobia, o comum medo de altura, porque assistir esse filme lhe causará calafrios.

 

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