A Origem de Tudo – “A Cidade Antiga”

A vida organizado da sociedade moderna nos faz distantes do questionamento de como ela mesma surgiu, parece-nos tudo tão posto, tão concreto, que pensamos que sempre foi desse jeito. Somente com um mergulho profundo na história é que descobrimos que, na verdade, existe uma grande evolução de séculos para que surgisse a sociedade e a cidade como conhecemos hoje.

“A Cidade Antiga”, do historiador francês Fustel de Coulanges, que viveu no século XIX, voltou ainda mais na história, buscou detalhes sociais e jurídicos desde antes da História Medieval para entender a construção da sociedade atual (para ele, mas que com alguns detalhes que ainda vemos hoje, em pleno 2019).

Martins Fontes trouxe a obra para o Brasil no anos de 1980 e assim mostrou como é que a cidade surgiu. De antemão já digo, este não é um livro muito fácil de ser lido, tem teor científico e muitas páginas, ou seja, não é literário e é recomendável para realmente quem gosta de história e história do direito.

Se você for aquela pessoa que ainda está pesquisando curiosidades históricas, começando a ler sobre o tema, não recomendo muito, mas posso falar de outros livros sobre histórias. Talvez a leitura de “Cidade Antiga” te canse e você desista da empreitada, deixe-o guardadinho, depois que você tomar o gosto pelo tema pode voltar nele.

Bom, é um universo de informações que é até injusto resumir tudo, mas imagine um mundo organizado por famílias, elas não se interagem, as leis são individuais, assim como sua divindade. Esqueça por um momento todas as regras arraigadas do nosso tempo e conhecimento de épocas antigas, mas não tão antigas quanto a própria História Medieval.

Não olhe com os olhos de hoje para a realidade de séculos atrás, esse é o nosso maior erro quando tentamos entender a história, em qualquer tempo. O que funciona hoje nem existia há algumas eras.

Então como é que surgiu uma sociedade que presa pela união (nem que seja formal, de fachada), onde um país depende do outro? Melhor ainda, como é que surge um país quando nem as famílias podem interagir?

Pode parecer estranho, mas o ponto focal de tudo isso é a religião. Não com a ideia atual, as religiões que conhecemos são relativamente novas, surgiram depois que a cidade se consolidou, depois que pátrias se tornaram potências e suas divindades passaram a reinar para além da família.

A origem da religião vem da organização familiar. Todos os povos originais adoravam o fogo, não como símbolo de algo ou de alguém, mas o fogo por ser simplesmente o fogo. Era a chama divina que não poderia se apagar, aos poucos essa crença foi se dividindo pelos continentes, onde em cada canto tornou-se símbolo de religiões diferentes.

Quando ainda era o simples fogo, cada casa tinha seu altar, onde havia fogo acesso sempre e um punhado de cinzas. O sacerdote era o chefe da família e seus deuses eram os antepassados que já haviam morrido, ele era o responsável por os cultuar. Acreditava-se que a vida continuava no túmulo, por isso eram ofertada comida e bebida, esse era o ritual religioso (cada família tinha sua maneira de fazer).

Foi por causa dessa crença que surgiram as catacumbas e outros túmulos luxuosos, para que o “morto” pudesse ter conforto, alimento para a alma e para o corpo. Quem não fizesse tal oferta iria sofrer consequências, porque desagradava o seu deus.

Lentamente (mas muito lentamente) essa sociedade foi se modificando, os deuses foram se tornando públicos, bem como os rituais religiosos, as famílias foram se misturando, a sociedade se estruturando de acordo com as classes, que também tiveram a sua evolução. Até que a cidade surgiu, com o culto a sua pátria e a Deuses próprios.

Essa evolução ainda é distante de nós, mas já marcam detalhes que já temos ideia de como era na época. Foi a partir daí que surge a Mitologia Grega, por exemplo, quando cada cidade tinha um deus que a guardava e guiava sua rotina.

E o Direito nisso tudo? Somente ao entender que existiu essa evolução é possível entender os meandros de alguns ramos do direito. A sucessão, por exemplo, começou com o culto aos antepassados mortos, que apenas os homens poderiam realizar, logo as mulheres não tinham direito a sucessão.

E sucessão, neste caso, de rituais de família mesmo, porque o próprio direito de propriedade só surgiu bem depois. No começo era dito que a casa, a terra e todos os objetos pertenciam à família, os habitantes simplesmente usufruíam daquilo tudo, não havia algo de uma pessoa só. Com a evolução é que começou-se a cada um ter um patrimônio, podendo passar para seus sucessores quando morresse.

Pensem assim: tudo que estudamos hoje é resultado do que estes antigos praticavam, até mesmo as lutas que travamos hoje.

Os direitos das mulheres nem eram cogitados, ela tinha direito a ter os filhos e aceitar a religião do pai, depois do marido, apenas. Ela veio ter direito a propriedade séculos depois, mas ainda era indireto, podia apenas cuidar do patrimônio do filho menor até que ele mesmo pudesse cuidar.

A própria democracia, tão falada e buscada atualmente, não era nem um tópico antes que Roma, Tróia, Esparta ou Creta existissem. Nem mesmo Roma, o berço desse instituto, sabia do que se tratava, foi somente quando a sociedade se desenvolveu, tornando-se muito além de famílias aglomeradas, que viu-se a necessidade de algo que pudesse unir as vontades e concretizar, pelo menos, um meio termo.

Até hoje a sofrida democracia ainda não se encontrou de verdade, apesar de termos a impressão de viver em sociedade democrática (ou nem isso).

Apesar dessas importantes lições de direito, importantíssimas para quem deseja ser operador do mesmo, seja qual for o cargo, o que mais retirei de toda essa leitura foi a tal da religiosidade. Sabem por quê?

Porque já ouvi e estudei muito sobre algumas guerras e conflitos, seja os generalizados e amplamente conhecido ou aqueles do cotidiano, quando alguém não respeita as suas crenças, e vejo que nada disso resolveria os problemas. Criar um conflito como existe na Palestina ou nas redondezas de Jerusalém me soam como pecado quando se conhece a origem das religiões.

Como é que alguém, em pleno século XX ou XXI (alguns conflitos estão aí há décadas) pode achar certo matar milhões em nome de Deus (seja qualquer for a nomenclatura usada)? Isso nunca entrará na minha cabeça! Pensar que todos nossos antepassadas cultuavam o fogo e que ele foi origem de todas as religiões, isso só me mostra que somos mais iguais do que pensamos.

Unindo esse pensamento ao da evolução do direito, o surgimento de institutos legais que venham a proteger a sociedade, como podemos nos achar tão evoluídos quando fazemos esses tipos de conflito? Onde está a nossa inteligência, resultado de tanta evolução, quando não podemos conversar direito com alguém, preferindo matar inocentes por motivos ínfimos?

Eu não tenho essas respostas, infelizmente, mas digo uma coisa: leiam história, sejam curiosos, conheçam nossos antepassados, saibam como é que chegamos até aqui, aprendam com os erros e evite os repetir!

Reflitam…

Beijinhos e até mais.

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