Crítica: A Freira 2

Um dos comentários com amigos é que como a igreja católica é uma das mais fortes fontes para servir como roteiros de filmes de terror. E grandes filmes, incluindo dois super clássicos como O Exorcista e A Profecia. O ambiente soturno, gótico e sacro das igrejas, punições de Deus, anjos e demônios sempre povoaram nossos pesadelos e, para alguns, causa mais medo que louvação. Do universo de terror criado por James Wan, o Conjuring Universe, um dos grandes personagens, digamos, profanos da série é a freira. Demoníaca entidade que possui o corpo e a alma, um dos símbolos da devoção cristã, que são as imaculadas freiras. Valak, demônio romeno, tem atormentado desde conventos a casas londrinas dos anos 1970 e ganhou um filme solo, que particularmente é bem fraco, mas como fez estrondoso sucesso, ganhou uma continuação, que estreia essa semana nos cinemas do planeta, falo de A Freira 2 (The Nun II, 2023), com direção de Michael Chavez, figurinha carimbada do universo da possessão.

Após os eventos do primeiro filme da freira, Irmã Irene volta a um convento, onde a diversão das noviças é falar sobre a história de uma congregação romena que foi palco de uma tragédia. Nesse convento a Irmã Irene conhece a Irmã Debra, norte-americana que ainda busca certezas para seus votos como freira. Mas existem rumores que um padre foi incendiado vivo numa igreja e alguns eventos estranhos andam ocorrendo em um internato francês, que casualmente é onde trabalha como zelador Maurice, o Francês, sobrevivente junto com a Irmã Irene do ataque da freira no convento romeno. A igreja então manda novamente a Irmã Irene para investigar os passos desse estranho rastro de morte demoníaco que assola igrejas e o internato de meninas francesas.

De uma coisa tinha certeza, pior não poderia ficar: o primeiro filme, estranhamente fez muito sucesso, mas é um filme pouco assustador, que desperdiça um personagem do universo de terror extremamente sinistro. E a continuação, se não é uma sétima maravilha, ao menos capricha no quesito sustos e realmente mostra a força demoníaca da entidade Valak. Mais agressivo, mais poderoso e com uma fotografia mais digna, o diretor aproveita o cenário de um internato, crianças indefesas e fé religiosa, numa quase investigativa história para descobrir os motivos que fazem a noviça rebelde buscar vingança e aterrorizar os caminhos que cruza. Temos citações à Santa Luzia, capelas abandonadas, sinos sinistros, vitrais aterrorizantes e até um bode, materialização do coisa ruim, desfila suas guampas pelo longa. Não faltam jump scares, uns dos bons outros óbvios, gente jogada pra tudo que é lado pela força do mal, corredores, portas se fechando, enfim, todos aqueles artifícios centrais da série, mas infelizmente carece mesmo da falta dos Warren na trama. Mais uma vez a Irmã Irene, apesar do bom papel não segura a trama sozinha e tudo parece um pouco forçado no sentido que a freira faz gato e sapato nas mais diversas formas e o pessoal parece que nenhum arranhão leva, enfim, filmes de terror tem essa licença poética.

No elenco, mais uma vez Taissa Farmiga, manda bem no papel da Sister Irene, atua corretamente, mas ainda carece do carisma de sua irmã e no filme faz falta uma parceria digna. Storm Reid, como a freira do Mississipi, vítima do racismo, ainda não é a parceira ideal para caçar freiras endemoniadas. Jonas Bloquet, como Maurice, o Francês, está mais solto no papel, literalmente possuído, mas fica difícil crer em algumas situações de como é controlado por Valak, come o pão que o diabo amassou  e sobrevive a isso tudo.

Às vezes o filme também é quase uma caçada por artefatos, meio Indiana Jones e Código da Vinci, a busca pelos olhos de Santa Luzia movimenta o lado aventureiro da Irmã Irene e as buscas pelas respostas em histórias bíblicas, sobre santos e demônios, tem leve inspiração em determinados filmes. Os efeitos especiais são razoáveis e mais uma vez quem manda no filme, e com razão, é a freira, interpretada novamente por Bonnie Aarons. Encarnando a terrível criatura, é responsável por momentos de tensão no filme, que se perdem no desfecho um tanto forçado por uma conclusão preguiçosa para um ser tão diabólico, mas ela assusta com suas caras, bocas, surgindo da penumbra, pelas costas, espelhos, paredes e sombras, um personagem muito bom que com certeza já está no panteão dos mais conhecidos dos filmes de terror gerando cosplays terríveis de tão ruins em carnavais e festas à fantasia.

A Freira 2 tem o mérito de ser melhor que o primeiro. Mas é só. É apenas um filme de terror convencional, que pouco acrescenta ao universo invocação do mal, tem uma história quase detetivesca e mística, utiliza o que de mais medo a igreja católica e seu lado sombrio nos apresentou, tem atores esforçados, mas sem o carisma do casal Warren. Provoca sustos mais fortes e tem um terror mais agressivo e explícito, mas naufraga no mais do mesmo de sempre, com um roteiro que acelera as soluções no final do filme e prende muito pouco a atenção. Mas é claro quem é fã do gênero não deve deixar de assistir, e quem é fã de James Wan mais ainda, em mais um capítulo de seu bem sucedido universo, mesmo que contando com uma freira encapetada e feroz atazanando conventos, igrejas e internatos dos anos 1950, cada vez mais temos saudade de Lorraine e Ed, com seus problemas em casas mal assombradas dos anos 1970…

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