Criolo 50 – Araújo Vianna
E o ilustre Kleberson Cavalcanti Gomes cinquentou. Mais conhecido como Criolo, um dos maiores representantes da música brasileira dos últimos anos, chegou aos 50 anos de vida. Com uma carreira que aflorou desde criança, mas que só chegou nos estúdios de gravação em 2006, nos últimos 20 anos, Criolo, rapper de formação, abriu seus horizontes em ritmos como o reggae, e principalmente o samba, e hoje já pode ser considerado um grande sambista. E claro que pra comemorar esse meio século, nada melhor que seja no lugar que artista mais gosta de estar que é no palco. Com a turnê Criolo 50, ele anda percorrendo o país com um show que mapeia seus quase 20 anos de carreira. Porto Alegre o recebeu para mais uma memorável apresentação no Araújo Vianna na sexta passada, que eu conto logo abaixo.

Mais uma noite de casa cheia no Araújo Vianna. Criolo tem sempre uma sinergia grande com Porto Alegre e são raros seus shows que não temos casa lotada. E não seria na turnê dos seus 50 anos que seria diferente. Com um atraso considerável de meia hora, a sua banda, composta pelo DJ Dan Dan, Bira Sax, Ed Trombone, Xeina Barros, Bruno Buarque, Gustavo Souza e Ricardo Rabello, subiram no palco com uma imagem de São Jorge ao fundo no telão e já deixaram a plateia em êxtase com a introdução da canção Mariô, parceria dele com Emicida. Criolo entra no palco ovacionado pela ensandecida plateia, já de pé, que canta junto com ele e o Dj Dan Dan (interpretando a parte do Emicida). Duas de Cinco, do super disco Convoque seu Buda, segue o ritmo intenso do show, que só pára na seguinte música, Sistema Obtuso. Mas a pausa só serve para agradecer a plateia e dizer o quanto está feliz por tocar mais uma vez em Porto Alegre. Sem muito discurso e com muita música, segue com Esquiva de Esgrima. Poucas vezes vi, nas minhas inúmeras coberturas, vi uma plateia tão conectada. O povo simplesmente delirava, cantava junto todas as músicas, pulava e se emocionava com cada palavra do Criolo, realmente uma atmosfera contagiante, que mostra a força do cantor paulista.




O Dj Dan Dan então assume a boleia das pick ups e manda aquele som do Bob Marley, Is This Love, que a galera canta junto antes do Criolo meter dois reggaes seus com muita competência, Samba Sambei, do seu clássico disco Nó na Orelha e emenda Pé de Breque, mostrando toda a versatilidade do cantor, além do show do naipe de metais de sua banda.
A banda é de uma competência extrema, contando além do Dj Dan Dan, que também é um show à parte cantando e dançando com o chefe, tem Ed e Bira nos naipes, Xeina na percussão e voz, Ricardo Rabello no banjo e cavaco e Bruno Buarque e Gustavo Souza nos instrumentos de percussão. A celebração segue com Sucrilhos, mais uma do Nó na Orelha, de 2014, e que abre ala para as duas odes espirituais em forma de canção de Criolo, com o hino Ogum Ogum e toda a devoção a São Jorge e Ogum com aqueles versos “intolerância religiosa, ignorância maliciosa”. Segue com a porrada na mente Yemanjá Chegou, com frases como “no Brasil professor apanha e é processado” e “não fui eu que fiz a guerra e todo dia morre alguém”. Uma pequena prova que é um dos melhores letristas contemporâneos do Brasil.



E teve direito a parabéns ao cantor, com a galera batendo palmas pelas 50 velas apagadas de vida, isso antes de Araújo vir abaixo com Não Existe Amor em SP. Talvez um dos maiores sucessos da carreira e uma radiografia, na visão dele, de sua cidade natal, em mais um momento sublime da vibrante noite.
Chega o aguardado momento do Criolo sambista. Sentado no praticável do palco, ele, DJ Dan Dan e Ricardo Rabello mandam ver no samba com Menino Mimado, aquele diz que meninos mimados não devem reger uma nação (e não devem mesmo), samba dos bons. E a roda de samba segue com a sensacional Lá Vem Você, essa com ele e Dan Dan sentados em cadeiras na frente, e seguem com a malemolência da canção Linha de Frente. Logo depois o cantor sai de cena, mas antes chama a percussionista Xeina Barros. Ela então toma o microfone sem medo e levanta a massa com os dois sambas de Dona Ivone Lara, Alguém me Avisou e Sonho Meu, mostrando que além de ser uma exímia percussionista,tem uma bela voz e samba no pé. Criolo volta ao palco e segue com uma ótima interpretação de Benito di Paula no clássico Retalhos de Cetim. Coisa linda ver a galera cantar o inesquecível refrão que fala da cabrocha que não desfilou pro pobre rapaz no carnaval. Fino do samba!





O cantor surpreende cantando um tema do Dragon Ball, cantado em coro pela galera, paga um cartaz de uma professora que diz que se inspira nas letras dele para ter forças para ter aulas nas escolas públicas e o cantor afirma que só a educação é chave de todas as coisas. Segue o show com Subirusdoistiozin, de 2013, Grajauex, do Nó na Orelha, e o show, depois de diversas ameaças deles de que iria acabar, realmente chega ao fim com Convoque seu Buda, fechando a incrível noite.
Talvez um dos melhores shows do ano no Araújo Vianna, Criolo, além de mais maduro, cada vez mais prova sua versatilidade e como furou a barreira do promissor rap para ser uma artista completo, surfando muito bem em diversos estilos (com destaque aos seus ótimos sambas), sem jamais perder sua essência, que são suas letras sólidas, crônicas realistas do cotidiano, recheadas de ironias, crítica social e rimas, materializadas em boa música. Parabéns Criolo!

