Daniel 40 Anos Celebra João Paulo e Daniel no Araújo Vianna
Recordar é viver. Mais que uma expressão um tanto quanto óbvia, em um país que esquece tão rápido de sua história e cultura, o ato de lembrar, homenagear e através da música lembrar uma trajetória é mais que essencial. E é isso que Daniel, o sertanejo mais bom moço do gênero está fazendo, comemorando os 40 anos de sua vitoriosa carreira, jamais esquecendo do tempo em que, por 14 anos, teve ao seu lado seu parceiro, o inesquecível João Paulo, que virou saudades no ano de 1997, mas que nunca saiu da cabeça do cantor, que resolveu nessa turnê lembrar os sucessos da dupla. Uma viagem por esses curtos, mas inesquecíveis 14 anos. Daniel, que já tinha vindo aqui em maio com casa cheia, voltou ao Araújo Vianna, em Porto Alegre, para mais um show e apresentou o maravilhoso espetáculo Daniel 40 Anos Celebra João Paulo e Daniel. É claro que o NoSet estava lá e nas próximas linhas conta como foi esse inesquecível show.
Uma sexta-feira de bom tempo, em um setembro castigado por chuvas no Rio Grande do Sul, fez mais de 3.000 pessoas se deslocarem à Redenção e com esse ótimo público, Daniel por volta das 21h15min começa sua apresentação. Com um cenário caprichado, com direito a uma cascata no fundo do palco, sua banda em traje de gala e orquestra composta por músicos locais, depois de ouvirmos passagens da dupla em chamadas como se fosse um rádio ligado, Daniel surge de trás da cascata e começa com a canção que mudou o rumo da dupla. Estou Apaixonado, sucesso do sétimo disco dos cantores, é apresentado com um arranjo forte, sofisticado e Daniel esbanjando carisma e talento numa interpretação de arrepiar. E isso era só o começo do show. E como a noite era para lembrar João Paulo e Daniel, ele manda Só dá Você em Minha Vida, de 1993, e segue com a romântica Alguém, de 1995, em um exercício de nostalgia e lembrança para o público, que mesmo com canções nem tão conhecidas, cantava com vontade e emoção. Mas é com Desejo de Amar, mais conhecida como Undererê, sucesso de Eliana de Lima que a dupla gravou no longínquo 1991, que o povo levanta, canta junto e Daniel, com sua simpatia incrível, conduz a massa. Crossover sertanejo com pagode animando o Araújo.
A linda Ela Tem o Dom de me Fazer Chorar, do último disco da dupla, e cantada num medley com Que Dure Para Sempre, um dos primeiros sucessos da dupla de 1995, momento romântico do show. Hoje eu Sei, do mesmo disco da anterior, segue a homenagem a 1995, ano em que a dupla começou a fazer sucesso nacionalmente. Com Aos Trancos e Barrancos, Daniel relembra 1989, fase complicada de muita luta para os artistas conseguirem seu lugar ao sol e como foi árdua essa caminhada. Fogo de Amor, de 1992, e Cuida de Mim, de 1992, lembram bem essa fase, sucessos pontuais, mas pra quem estava na plateia e era fã de verdade, eram cantados a plenos pulmões. Uma coisa que eu sempre falo, com o estofo de dezenas de coberturas, não canso de afirmar que os cantores mais populares sim tem fãs que amam seus artistas, conhecem todas as músicas, já alguns bambambãs da MPB, a maioria do público que vai para lá é para postar em redes, na grande maioria vai ao show por status e por dizer que fui ver o tal fulano. Voltando ao Daniel, ah, tenho que falar do Daniel. Ele é um gentleman, cara educado, boa pinta, canta demais, chegamos a desconfiar como ele pode ser tanto essa pessoa do bem, mas o melhor: respeita seu público, fez juras de amor ao Rio Grande do Sul, e sabe que a razão de ser do artista é a plateia, a quem todo o artista deve a reverência, e isso Daniel jamais nega, dando aula de simpatia, amor à arte e a quem a consome.
Com Eu me Amarrei, sucesso de 1995, o Araújo Vianna vira uma festa só, com direito a dança do cantor, mostrando que não é apenas a voz que está em forma e sim, no alto dos seus 55 anos, continua um guri. Chega o momento que Daniel chama seu gaiteiro, gaúcho de Vacaria, para mostrar seus dotes no instrumento, onde desfila trechos de canções símbolo do estado, numa mostra da sintonia de Daniel com o local em que está tocando. Aí ele ataca de Céu, Sol, Sul, Terra e Cor e Canto Alegretense, fazendo a galera cantar num duo voz e gaita, rola até um Baitaca no meio, mas é com o Hino Rio-Grandense que a plateia levanta e canta junto, fazendo inclusive Daniel se emocionar. E aquela coisa, Daniel não existe mesmo, é de uma sensibilidade única e chama um fã ao palco, o Juliano, para cantar com ele Querência Amada, em um dos momentos de grande emoção do show. Segue a bailanta gaudéria com É Disso Que o Velho Gosta, de Berenice Azambuja e Gildo Campos, transformando o Araújo num enorme CTG, animado e dos bons.
Segue o set com aquela música que para o Daniel teve uma importância incrível depois do acidente que levou João Paulo. Explica que a última imagem que teve do parceiro foi de uma porta de um elevador se fechando, inicia a canção Te Amo Cada Vez Mais, que fala sobre essa porta se fechando e diz que não pode aceitar o fim, ponto divisor da carreira do Daniel, música que deu a força pra continuar. Não tem como negar que cai uma lágrima quente do olho com a emocionante interpretação, os arranjos de cordas e levada power ballad da lindíssima canção de 1997. Emoção genuína e marcante. Depois, em mais um crossover sertanejo e pagode, canta Fricote, que ficou famosa com a gravação deles com o Art Popular no ano de 1997, fazendo mais uma vez o auditório levantar e dançar junto.
Enfim vem o momento modão do show. Lembrando suas origens da roça, no interior de Brotas, ataca de Fazenda São Francisco (Maior Proeza), A Loira do Carro Branco, com berrante na mão anuncia Menino da Porteira, essa cantada ao lado de sua backing vocal e fecha a fase caipira com Dia de Visita, trágica moda de João Paulo, do ano de 1993. Daniel então sai de cena, vai trocar de figurino e deixa o show para seus exímios backings vocals cantarem Com Qual Carícia. Na volta ao palco, chama uma menina pra dançar com ele a canção Só eu e Você, em mais um momento de demonstração de simpatia e carinho pelo público, mais Daniel impossível. Em mais um dos inúmeros momentos emblemáticos do show, convida ao palco Jessica, filha de João Paulo, que tinha 6 anos quando o pai partiu, e juntos cantam o sucesso Minha Estrela Perdida, mais uma power ballad anos 1990, com a platéia de pé cantando junto em mais um daqueles momentos de guardar para sempre.
Segue o baile com Te Cuida Coração e Rosto Molhado, onde chama mais uma espectadora para dançar junto. E falando novamente de Daniel, não custa dizer que ele sempre agradece ao público pela sua carreira, que o quanto é um privilegiado pela vida que tem e como fazer seus fãs felizes é sua meta, além de sua fé inabalável que fez começar, recomeçar e continuar sendo um dos cantores mais amados do país, e ele agradece a sua fé numa interpretação pessoal e tocante de Romaria, de Ricardo Teixeira. Segue com uma imagem de Nossa Senhora de Aparecida, que entrega para uma senhora da público para cuidar por uns dias e essa senhora define o que é o Daniel em poucas palavras: “tu não existe!”. Não acreditamos em tanta simpatia e doação de um cantor para seus admiradores. De bate pronto ele sentado na beira do palco dedica a senhora um dos seus maiores sucessos da carreira solo, Declaração de Amor, fazendo o Araújo Vianna levantar e cantar junto, que quase sem tempo, já emenda talvez seu maior sucesso solo, Adoro Amar Você, que honestamente, pelo carisma e o bem que faz o cantor, poderia viver fácil fácil mais 200 anos. A festa encerra se com A Jiripoca Vai Piar, com a galera em êxtase, cantando, dançando, muitos na frente do palco, com seus celulares em punho e cartazes de ode ao ídolo (que fez questão de ler um a um e prometer fotos com os que os levaram). Encerrando o baile do Daniel, ainda apresenta a competente banda e tem seu momento Roberto Carlos, mandando rosas para os fãs.
O espetáculo Daniel 40 Anos Celebra João Paulo e Daniel, sem dúvida foi um dos maiores shows que cobrimos nessa caminhada de matérias pro NoSet. Daniel, além de ser um cantor incrível, ter uma banda sensacional que caprichou nos arranjos para essa turnê, ter um repertório que está na boca do povo, é uma pessoa única. Poucas vezes vi tanta sintonia artista e público e um artista ser tão respeitoso com quem é a sua razão de ser, que é o fã. Empatia à flor da pele, profissionalismo e amor à arte, além de ter a sensibilidade de nesse show homenagear suas origens, seu parceiro Daniel e mostrar o quanto a dupla representou para a música brasileira, extrapolando os limites da música sertaneja e entrando no panteão da música verdadeiramente popular do Brasil. O filho de Brotas nos presenteou com um emocionante show, um dos grandes momentos do Araújo Vianna, que ficará para sempre na memória dos porto-alegrenses que tiveram o privilégio de presenciar tudo isso. E o NoSet se sente um dos privilegiados por esse momento mágico da música.
Crédito das fotos: Vívian Carravetta
