Motorrad é um filme inesperado no cinema brasileiro, principalmente se levarmos em conta a tendência à produção de comédias, filmes com youtubers e os dramas que surgiram nos últimos tempos. O diferencial dessa nova produção nacional, distribuída pela Warner Bros Entertainment é a conciliação entre a narrativa de quadrinhos (planos inesperados, tomadas rápidas e uma linguagem gráfica forte) e o cinema (a ferramenta que dá vida aos devaneios de desenhistas e roteiristas das HQ). Enfim, Motorrad é um mix entre os gêneros Thriller, suspense e terror.
A trama.
O filme não tem a pretensão de ser algo com manual, explicado em todos os seus pormenores. Tudo fica muito vago e algumas conclusões estarão por conta do espectador, assim como muitos autores literários fazem. Não há mal nisso.
O que o diretor Vicente Amorim nos apresenta é uma história onde o jovem Hugo (Guilherme Prates), que deseja ingressar em um grupo de motociclistas, se depara com uma misteriosa mulher chamada Paula (Carla Salle). Ela será algo irremovível de seu destino (o que fica logo evidente) quando ele e seus amigos se deparam novamente com ela em uma localidade isolada e misteriosa.
Basicamente o longa se resume à perseguição (sem motivo aparente) do grupo de jovens por outro grupo de motociclistas que jamais têm a identidade revelada. Essa gangue sombria faz alusão aos quatro Cavaleiros do Apocalipse… e são tão fatais quanto.
Em um misto de Mad Max, Sexta-Feira 13 e o Massacre da Serra Elétrica, as mortes começam e aparentam não ter fim. Tão estranhamente quanto apareceram, os motociclistas assassinos somem, o que cria um clima de “gato e rato” tenso. Sem motivos, sem palavras ou remorso, os agentes do mal querem apenas torturar psicologicamente e matar.
Espectador mal acostumado.
Saí da cabine com impressões muito boas. Evidente que há lacunas no roteiro, mas é vital observar o esforço de elenco, diretor e equipe para criar um filme de ação e suspense digno.
Há muitos elementos que impressionam em Motorrad. A trilha sonora é tensa e dá mais impacto às cenas de ação. A fotografia é boa. Os takes são diversificados, com destaque para os closes nas corridas com as motos. A locação foi bem escolhida e dá a impressão de haver uma prisão ao ar livre, pois os personagens não conseguem se evadir do local de forma alguma.
Em suma, Hugo e seus amigos são levados por Paula até uma armadilha que deixa o espectador na dúvida se estão em outra dimensão ou se aconteceu uma viagem temporal. Essas dúvidas são ideais para aguçar a imaginação do público, ao invés de jogar na cara deles algo formatado.
Há passagens que incomodam por não haver muita coerência, onde personagens no escuro se escondem com lanternas e lampiões acesos. Isso é de um despreparo terrível, mas pode refletir – na visão do diretor – a falta de raciocínio de pessoas acuadas e ameaçadas de morte. Por esse prisma há coerência nessas cenas.
Quanto ao público que reclamou – alguns com ênfase excessiva – do filme, creio que eles se esqueceram de um passado não tão distante onde filmes e animações nacionais eram motivo de piada, principalmente thrillers e terror, dois gêneros presentes em Motorrad. Claro que precisamos exigir mais de nossos produtores e diretores. Qualidade e obras bem acabadas são uma obrigação em um mercado competitivo, porém enxergo Motorrad como uma experiência, uma espécie de laboratório que indica o seguinte: o cinema de ação e terror no Brasil tem um futuro muito promissor.
Diante disso tudo, o que posso afirmar é que entre prós e contras, Motorrad me surpreendeu pela coragem e por sua produção muito bem elaborada. O roteiro poderia cobrar mais dos atores e ser mais coerente. Ainda assim, o filme é uma bela homenagem aos clássicos do gênero e, repito, abre um leque de opções para as produções futuras.
Com base nos personagens criados por Danilo Beyruth, o longa-metragem conseguiu nos brindar com um Road Movie inesperado, sinistro e diferente de tudo que vimos nos últimos anos no cinema nacional. Sangue, medo, terror e ação em meio a um labirinto onde a única fuga possível é morrer.
Destaque para a árida e apocalíptica locação na Serra da Canastra, cujo destaque ficou por conta da boa fotografia e paleta de cores.
Finalmente chegou a hora de sair do marasmo dos gêneros lucrativos!