Você vive nos Estados Unidos da América. A extrema direita do partido republicano está no poder. O presidente bronco e obtuso mantém uma acirrada guerra contra a imprensa. Utiliza toda a força do governo para pautar as matérias e desacreditar qualquer pessoa que critique o seu governo. Há um clima de tensão e medo no ar.
Não, não estamos no presente. Estamos no início dos anos setenta. Os EUA são governados por Richard Nixon. A primeira coisa que você deve saber sobre POST, é isso: o filme é ambientado no passado, mas mira o presente.
O filme retrata, com bastante fidelidade, uma série de fatos que marcaram a história e os limites da imprensa (livre). Assim, não há como falar em “spoiler”.
O jornal The New York Times tem acesso a documentos vazados do Pentágono. Uma “enciclopédia” de mais de sete mil páginas, com análises, dados, decisões e seus respectivos motivos, tanto sobre a Guerra do Vietnã, quanto sobre a política interna e externa dos Estados Unidos. Os segredos revelados pelos papéis atravessam três governos e afetam democratas e republicanos. Ao começar a publicar uma série de matérias sobre eles, o Times é impedido por uma ação movida pelo Governo, com base na lei de espionagem.
Os papéis chegam, então, ao jornal The Washington Post, por ação do repórter Bem Bagdikian (Bob Odenkirk, o Saul de Breaking Bad e Better Call Saul). O Post, naquele momento, ainda lutava para ombrear o Times e se estabelecer como um jornal de âmbito nacional e uma referência na imprensa escrita. O drama se dá quanto à decisão de publicar ou não o material. Trazê-lo a público pode ser considerado uma traição, com a prisão dos envolvidos. Além disso, pode acarretar o fracasso da abertura de capital do Post na bolsa de valores, que estava sendo realizada naquele mesmo momento.
O filme é conduzido por uma “santíssima trindade” cinematográfica. Steve Spielberg na direção, Meryl Streep e Tom Hanks nos papéis principais. Vou poupar você de comentários sobre a carreira dos três.
O que surpreende é como Meryl ainda consegue surpreender com a qualidade da sua atuação. Ela personifica Katharine Meyer “Kay” Graham. Apesar de formada pela Universidade de Chicago e de ter trabalhado como repórter, Kay era uma socialite que, depois do suicídio do marido, passa a ser dona de um dos maiores jornais dos USA. Nunca quis ou se preparou para o cargo.
Maryl Streep, apenas com suas expressões e seu gestual, faz você quase poder tocar as hesitações e dúvidas de Kay; sua indecisão entre prejudicar ou preservar pessoas que conhecesse intimamente das rodas de poder que frequenta. Com a interpretação dessa mulher dividida entre cumprir o papel do jornal e o risco de perder a empresa construída pelo avô, Meryl recebeu mais uma merecida indicação para o Óscar de melhor atriz. A indicação também seja, talvez, uma resposta da Academia à polêmica que envolveu a atriz e o presidente Norte Americano no ano de 2017.
Tom Hanks tem uma atuação segura, sendo ele mesmo (com algumas caretas que não acrescentam ou comprometem a atuação) no papel de Ben Bradlee, o editor-executivo. Nele, estão representadas e sintetizadas todas as qualidades de uma imprensa livre, investigativa e que não se deixa intimidar, mesmo ante o risco de perder o emprego e, talvez, a própria liberdade. Bradlee é um personagem utilizado como símbolo.
Steve Spielberg conduz com competência a narração da história. Não há qualquer destaque para a fotografia, que tenta criar um clima de permanente tensão com relativo sucesso, o cenário (a não ser que você seja um saudosista das velhas impressoras de jornais), a direção de arte ou a trilha sonora.
O roteiro é simples e linear. Há tensão, drama, algum alívio cômico e o desenlace no momento em que todos esperam. The Post – A Guerra Secreta, foi produzido para ser fácil e palatável, “desenhando” para a plateia a importância de se ter uma imprensa livre e a que interesses ela deve servir. A indicação para melhor filme do Óscar é o seu topo. Não tem musculatura ou pretensão de concorrer com Dunkirk, por exemplo. Aqui, novamente, a simples indicação vale como uma chancela da Academia à mensagem que o filme pretende passar.
Para quem não se recorda, o The Washington Post, algum tempo depois dos fatos retratados no filme e ainda comandado por “Kay” Graham e Ben Bradlee, foi protagonista no escândalo Watergate, que culminou com a renúncia de Richard Nixon. Inclusive, as cenas finais evocam esse episódio.
Algum recado para o Trump?
http://https://www.youtube.com/watch?v=EIx6T_WXOT0
Direção: Steven Spielberg
Roteiro: Josh Singer, Liz Hannah
Produção: Amy Pascal, Kristie Macosko Krieger, Steven Spielberg
Fotografia: Janusz Kaminski
Trilha Sonora: John Williams
Estúdio: Amblin Entertainment, DreamWorks Pictures, Participant Media, Pascal Pictures
Montador: Michael Kahn, Sarah Broshar
Distribuidora: Universal Pictures
Elenco: Alison Brie, Austyn Johnson, Bob Odenkirk, Bradley Whitford, Brent Langdon, Bruce Greenwood, Bryan Burton, Carrie Coon, Christopher Innvar, Coral Peña, David Cross, Deborah Green, Deirdre Lovejoy, Gary Wilmes, Jennifer Dundas, Jesse Plemons, Jessie Mueller, John Rue, Justin Swain, Kelly Miller, Luke Slattery, Matthew Rhys, Meryl Streep, Michael Cyril Creighton, Michael Devine, Michael Stuhlbarg, Pat Healy, Philip Casnoff, Rick Holmes, Robert McKay, Sarah Paulson, Sasha Spielberg, Stark Sands, Tom Hanks, Tracy Letts, Will Denton, Zach Woods.