A apresentação deste post é para evidenciar o quanto Divinas Divas pode acrescentar como documentário e como um lembrete da necessidade do respeito pelo ser humano, não importa sua cor, credo, aparência ou opção sexual. Dirigido pela atriz Leandra Leal, o filme retrata o reencontro de sete divas do teatro nacional… todas travestis.
Apesar de ser algo incomum hoje em dia, elas não foram pessoas que estavam restritas à prostituição. Em seus tempos áureos, Rogéria, Marquesa, Camille K, Jane Di Castro, Divina Valéria, Eloína dos Leopardos, Brigitte de Búzios e Fujika de Halliday eram destaques no teatro, mesmo sob a supervisão da censura da época (período da ditadura militar).
Apesar do preconceito – que permanece até nosso tempo -, todas as travestis desse documentário fizeram fama e dinheiro substituindo as vedetes. Foram capas de revista, participaram de programas na TV e tinham uma vida até confortável sendo quem elas realmente eram. Algumas mantiveram parte de seus patrimônios adquiridos durante o período de fama, mas outras só têm o suficiente para se manter de forma digna. Esse contraste se dá em função de alguns excessos, gastos demasiados e também por causa do fim da “fama”.
Agora, mais de 50 anos após, nos deparamos com pessoas comuns que vivem e se orgulham do que são. Isso é algo muito legal, já que nem todos sabem lidar com o anonimato depois de tanto sucesso. Claro que há pessoas que as reconhecem, porém nada perto daquilo que viveram quando eram estrelas do teatro, pessoas que estavam presentes nas mídias da época.
Leandra Leal conduz com maestria as Divinas Divas. Ela tira depoimentos de quem nem sempre quer falar sobre determinados assuntos. Há emoção, beleza, saudosismo e muita, muita honestidade em cada uma delas. O mesmo resultado é obtido com alguns dos companheiros que estão há anos, décadas ao lado das travestis e as tratam com o máximo de amor e respeito possível. São pessoas que se amam e jamais se importaram com as críticas vindas da sociedade, dos amigos e da família. Amor incondicional, não resta dúvida.
Nessas entrevistas, dois dos companheiros dão demonstrações de amor simplesmente emocionantes, além de comprovarem que o amor pode superar doenças, o tempo e os olhares de soslaio tão característicos sofridos por quem escolhe amar um travesti.
Marquesa é uma das Divas e impressiona por seu esforço para estar no palco. A saúde debilitada é posta de lado quando ela abandona o visual de um senhor e volta a ser a estrela que marcou os palcos do teatro. Todas, sem exceção, são afetadas por esse retorno triunfal ao palco do Teatro Rival, inclusive a diretora Leandra Leal que cresceu vendo as travestis com suas excentricidades, bom humor e talento no palco que foi de seu pai, sua mãe e agora está sob a responsabilidade dela. Mais do que isso, ela conviveu com as pessoas (os seres humanos com seus defeitos e virtudes) por trás das estrelas que eram nos teatros.
Vocês irão se entristecer, rir e entender um pouco mais não só da vida das oito divas, como também compreenderão um pouco mais desse universo tão incompreendido, controverso e cheio de glamour, fantasia e, ainda, muita tristeza. No fim, o que permanece na mente e no coração dos espectadores é a compreensão de que nem tudo são flores para elas, porém elas sempre darão um jeito de tê-las.
Divinas Divas é um documentário que merece a divulgação, o respeito e a presença do público, pois foi feito com muito carinho, esforço e dedicação por parte da própria Leandra e das travestis que sabem ser atrizes e não estão no palco para chocar, apenas para interpretar. As Divinas Divas são ícones da primeira geração de artistas travestis no Brasil dos anos 1960. Um dos primeiros palcos a abrigar homens vestidos de mulher foi o Teatro Rival, dirigido por Américo Leal, avô da diretora. Esse reconhecimento é evidenciado pelas oito durante todo o filme.
Pena que um documentário desse não esteja acessível a todos, já que certamente seria uma ótima ferramenta para diminuir o ódio que as pessoas têm com relação não só aos travestis como a toda a comunidade gay. Muitos não demonstram, mas é fato que o desprezo, o preconceito e a raiva ainda estão presentes nos dias atuais.
Documentário 100% recomendado por ter uma abordagem corajosa, linguagem real e sem censura, além de um tema polêmico e necessário que é o respeito às diferenças.
Estreia: 22 de junho nos cinemas. Saibam mais em www.sessaovitrine.com.br.