Pode parecer clichê, mas eu realmente não esperava nada de La Vingança. O filme aparentava – pelo menos o trailer indicava – ser um filme com pouquíssimos recursos e uma tentativa dúbia de união de atores brasileiros e argentinos.
Então, eis que surge a primeira cena. Lá está Caco (Felipe Rocha), em um telhado muito alto. Seu telefone indica a chegada de uma mensagem e ele a lê. Sua mente vaga, preocupado com algo. Mas as soluções para suas preocupações está diante dele que, sem pensar, salta. Bem, não foi o melhor salto da história do cinema, porém serviu para a cena que era, na verdade, a gravação de uma outra cena de um filme de ação.
Caco é um dublê. Um cara que está à beira de tomar a mais radical das decisões que um homem pode fazer em sua vida: pedir a mulher amada em casamento. Seu melhor amigo, Vadão (Daniel Furlan), tenta convencê-lo a não ir, mas Caco está decidido. Até aí, tudo bem. Até aí…
Quando chega ao trabalho de sua namorada, Julia (Leandra Leal), ele se depara com ela transando com seu chefe argentino, o pop Chef Facundo Flores (Adrián Navarro).
Ao contrário do que muitos imaginam, ele não reage violentamente. Sua serenidade chega a surpreender. Apático após tal trauma, Caco conta para Vadão o que ocorreu e é aí que começa uma divertida aventura de dois brasileiros em busca de vingança na Argentina.
Rixa antiga.
La vingança vai bem além de uma simples comédia. Ele maximiza a níveis espetaculares a velha intriga entre brasileiros e argentinos. Qual país é o melhor? Quem tem as melhores mulheres, a economia mais estável e, principalmente, quem tem o melhor jogador de futebol de todos os tempos? Tudo é motivo para a disputa entre nós e los hermanos.
Assim, Caco e Vadão, impulsionados pela sede de vingança, partem para a Argentina de carro, o Opala chamado Jorge, e se deparam com algumas das mais divertidas situações. Eles se dão mal demais em muitas passagens, principalmente por conta do mal humor de Caco (e quem ficaria humorado diante da traição?) e do excesso de confiança de Vadão. Vamos acrescentar a essa fórmula potencialmente hilária o fato de que as duas culturas são – em parte – diferentes.
Diferente dos tempos da comédia de pornochanchada, La Vingança não apela para o sexo como forma de divertir o espectador. E isso poderia ter ocorrido, pois se trata de um filme onde uma dupla resolve “pegar” todas as mulheres para se vingar do argentino galã. A decisão do roteirista e do diretor de ir por outro caminho é acertada e bem mais divertida. As cenas em que eles tentam seduzir as argentinas são alguns dos pontos altos e mostram o quanto eles são engraçados. Os diálogos e frases de incentivo de Vadão, só para citar, são memoráveis e reforçam a personalidade aloprada dele. Mas também escondem um cara com pouca confiança em si mesmo, principalmente diante das mulheres.
Já Caco é o famoso “mala”. Suas conversas – mesmo na balada – só mostram o quanto ele é infantil e inseguro… e hilário. De qualquer forma, mesmo frente a frente com as incontáveis recusas, eles conseguem pegar algumas argentinas. Ou não. É nessa ocasião que nos deparamos com um Vadão não tão confiante (mas ainda contador de histórias) e um Caco 100% chato. Cada uma das cenas em que eles estão na luta pela mulherada é mais engraçada que a outra, sem precisar apelar para a sacanagem explícita.
O roteiro conduz os protagonistas para uma jornada de redenção e, sobretudo, reforço da amizade. Eles vão se reinventando conforme os problemas surgem e, não duvidem, há problemas e loucuras suficientes para manter a plateia rindo durante todo o filme.
A jornada do Herói #sqn
La Vingança é, em parte, um Road Movie que brinca com as nossas inseguranças. Cada experiência – boa ou ruim – serve para aproximar os amigos brasileiros, porém também tem a função de evidenciar que não somos tão diferentes dos argentinos. A malandragem típica do brasileiro não surte efeito diante da malandragem argentina. Isso fica bem evidente logo na chegada à fronteira, quando a dupla é abordada por militares que servem de prévia para o que eles irão passar em território argentino.
Com o passar da trama, entre altos e baixos, os amigos se deparam com belas mulheres, situações embaraçosas, a zoeira e a incompreensão dos argentinos diante dos dois loucos, além de pequenos, porém marcantes, lembretes sobre respeitar o território desconhecido. E é em meio a essa confusão divertidíssima que os brasileiros crescem como pessoas. O inconsequente Vadão se mostra um amigo sincero. Louco, mas sincero. Caco deixa a auto-piedade o atingir com força, mas há uma linda argentina que desperta, aos poucos, a percepção de que a vida continua.
Resumidamente, eles crescem como pessoas e amigos a cada nova lição. E nesse ínterim, o público ganha algumas das mais divertidas cenas em uma comédia dos últimos anos.
Atuações argentinas.
O idioma espanhol seria uma barreira, mas em nada atrapalha. As legendas – algo que a maioria dos brasileiros já está acostumada – deixam o espectador confortável para compreender a narrativa. As atuações dos principais atores estrangeiros também são consistentes. Destaque para a lindíssima atriz e cantora francesa Aylin Prandi (Lupe) que interpreta uma cantora que se aproxima de Caco (ela é responsável por uma agitada versão de Besame Mucho). Também têm boa participação os atores Adrián Navarro (Chef Facundo), Gastón Ricaud (um engraçado argentino que atormenta Caco e Vadão), Ana Pauls (Constanza) a noiva em fuga.
Durante os créditos vocês verão algumas versões divertidas do hino de torcida “decime que se siente la venganza”.
Notas finais.
O filme me fez rir como há muito não acontecia. Mais do que isso, La Vingança se mantém em um ritmo rápido e engraçado, mantendo o espectador atento à trama e ao caos que Caco e Vadão se metem. Essa constância é fundamental para cativar o público sem apelos para sentimentalismo ou algo que seria aguardado em uma história sobre a busca pela vingança ou redenção de um homem traído.
O âncora do filme – em termos cômicos – foi Daniel Furlan. Assim, eis uma entrevista com o ator sobre os bastidores das gravações: entrevista com Daniel Furlan.
Caco acaba por encontrar muito mais que uma simples vingança e nós, espectadores, encontramos muito mais que um simples filme de humor. La Vingança é uma obra divertida, bem elaborada, com atores engraçados e versáteis, cuja narrativa surpreende ao unir os road movies com a comédia. Isso sem contar na interessante lição sobre a superação de nossos traumas.
Dados Técnicos.
Direção – Fernando Fraiha e Jiddu Pinheiro.
Elenco – Felipe Rocha, Daniel Furlan, Ana Pauls, Leandra Leal, Aylin Prandi, Adrián Navarro e Gastón Ricaud.
Roteiristas – Thiago Dottori, Pedro Aguilera, Jiddu Pinheiro, Felipe Sant’Angelor e Fernando Fraiha
Coprodução – Querosene Filmes, Paris Filmes, Zarlek Producciones, Biônica Filmes,Telecine e Globo Filmes
Para fechar com chave de ouro, um clip da cantora e atriz Aylin Prandi. ¡Hasta en breve, amigos!