Sofá Digital: O melhor professor da minha vida

Definitivamente, não se trata de um tema original, tampouco apresenta alguma inovação – seja esta cinematográfica ou pedagógica. O filme é uma “comédia dramática” com alguns bons momentos cômicos e algumas situações difíceis, mas não é o filme para te fazer rir ou chorar. É mais um filme para refletir sobre o sistema de ensino. Apesar de ter sido filmado na França, cabe perfeitamente no nosso modelo de ensino. A questão aqui é que, tal como um aluno precisa repetir várias vezes um mesmo exercício para aprender seu conteúdo (ou alguém aqui aprendeu matemática só com prova oral?), parece que também precisamos ver diversas obras desse gênero para aprendermos algumas lições. Não lições de disciplinas, mas lições de vida.

Apesar de que em um mundo ideal, “educar” deveria ser responsabilidade da família, e “ensinar” tarefa do corpo docente, muitas vezes os professores acabam acumulando papéis – pai, professor, psicólogo, e – por que não? – amigo. E mais do que isso, alguns se tornam referências, exemplos, modelos, influenciadores! Claro que deve existir um limite, e hoje em dia convivemos com problemas como a completa falta de respeito por parte de alguns alunos e excesso de autoritarismo por parte de professores.

Mas é fato que a influência de um professor pode ser muito positiva ou extremamente negativa. E isso não depende apenas da personalidade, competência, postura ou aptidão do professor, mas sim de um conjunto de fatores, que envolve, além do professor e aluno, o restante do corpo docente, a turma, a escola, a família, a sociedade, o ambiente, o Estado, etc. às vezes uma palavra ou gesto de um professor pode ser suficiente para fazer um aluno abandonar a escola, mudar de curso, desistir de sua carreira. Como também tem aqueles que são exemplos de vida, espelhos da profissão, e que são lembrados como pessoas que marcaram suas vidas de forma positiva.

E quando se trata de escolas de “periferia”, ou melhor dizendo, escolas que majoritariamente são compostas por alunos e famílias de baixa renda, a situação ainda se agrava, pois o ensino concorre com o tráfico, gravidez precoce, necessidade de abandonar a escola para trabalhar ou cuidar da família, e outras “prioridades” sociais. Fatores externos que em tese nem deveriam ser considerados por estarem fora de sala de aula, mas que de uma forma ou de outra acabam influenciando todo este conjunto de engrenagens que fazem a roda do ensino girar. Este texto poderia continuar por páginas e mais páginas discutindo qual realmente é o papel do professor, da sociedade, do Estado, da família, mas precisamos voltar ao foco.

Neste longa temos um professor catedrático de literatura François Foucault (Denis Podalydès), extremamente rígido e enérgico com seus alunos, todos de alto poder aquisitivo, em uma das melhores escolas de Paris. Para o professor, estudar e tirar notas altas não é mais do que a obrigação de seus discentes, pois eles estão ali para isso. E, dessa forma, o professor acaba se sentindo à vontade para “humilhar” publicamente seus alunos que obtiveram um fraco desempenho em suas avaliações, sem nenhum tipo de constrangimento ou culpa de sua parte (e pelo que aparenta, ele considera essa atitude pedagogicamente normal).

De repente, sua vida muda 180° e ele acaba indo para em uma escola da periferia para lecionar durante um ano. E logo ele percebe que seus métodos “tradicionais” não irão funcionar nessa nova realidade. Uma classe completamente heterogênea formada por alunos desinteressados, e pior que isso, desacreditados. Aos poucos o professor vai percebendo não apenas as falhas dos alunos, mas as suas próprias falhas, e aos poucos vai ganhando a confiança das pessoas, modificando seus métodos, e vivendo aquela nova realidade não como um fardo ou uma obrigação, mas com a convicção de que ele pode melhorar as notas e a vida das pessoas. Com livros, com exemplos, com atenção e com respeito ao próximo. O longa foca no aluno Seydou (Abdoulaye Sialo) para representar todos os desafios e transformações na vida do professor e de sua turma.

O que parecia ser apenas um professor metódico, exigente, e ainda por cima responsável por uma disciplina “chata”, mostra que tudo na vida é uma questão de adaptação. O filme possui ótimos momentos, em que percebemos que uma palavra ou frase mal colocada pode arruinar a vida ou a motivação de um aluno. Assim como o inverso pode ser tudo que ele precisa para se motivar a continuar estudando. Duas frases do filme (opa, spoiler) pode resumir muita coisa: “não existe aluno ruim!” e “Os alunos não querem aprender ou o professor é que não torna matéria interessante?”

Um ambiente de ensino é quase como um casamento. Não pode existir só um lado, você tem que compreender como o outro vive e se comporta, e equilibrar suas perdas e ganhos. Não adianta apenas impor sua posição e suas convicções, e não se importar se o outro irá corresponder conforme suas expectativas. Seria muito fácil continuar seus ensinamentos da mesma forma como sempre esteve acostumado, reprovar todos os seus alunos e ir embora ao final do ano com sua “tarefa cumprida”. A tarefa poderia sim ter sido finalizada, mas e a sua missão? Porque hoje em dia ser professor não é mais uma profissão. É quase uma vocação. E, quando você compreende que precisa mudar, e suas mudanças são positivas, isso certamente irá influenciar as pessoas à sua volta, contagiando, servindo de inspiração, fazendo com que as pessoas passem a refletir sobre suas atitudes. Seu mundo muda quando você muda!

“O melhor professor da minha vida” (Les Grands Esprits), dirigido por Olivier Ayache-Vidal, está disponível pelo serviço de streaming Sofá Digital nas plataformas NOW (R$14,90) / VIVO PLAY (R$ 11,90) / Google Play (R$9,90) / Youtube (9,90) / iTunes (R$ 11,90)

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