Papillon (2018): obra honesta e à altura do livro de Henri Charrière.

Papillon (2018) é um remake do filme homônimo de 1973. Na verdade, ele serve como um complemento ao mesmo e uma bela apresentação ao público do século XXI à obra original.

O filme de 1973 é um clássico absoluto e contou com atuações marcantes de grande parte do elenco, em especial Dustin Hoffman e Steve McQueen, cujos talentos deram vita a Dega e Papillon, respectivamente.

Mas, perguntam os leitores menos pacientes, esse filme é realmente necessário? Não poderíamos apenas ficar com a obra original? Vamos às respostas…

Nova (e pertinente) versão.

Sejamos honestos: o público de hoje, com poucas exceções, não tem tempo ou não quer ver produções antigas. Em meio às redes sociais, compromissos, séries, livros, novos filmes a todo momento (e sabe lá o que mais), dificilmente o espectador moderno irá buscar o material antigo.

Ainda que as obras antigas tenham qualidade e sejam clássicas, há as limitações técnicas que são frutos do período em que foram produzidas. Papillon, por exemplo, tem atuações fantásticas, mas as imagens parecem opacas ou escuras demais em alguns trechos. Até os efeitos são simples quando comparados ao cinema atual. Isso, claro, é fruto da evolução do cinema em si, porém é inegável que tais limitações das obras mais antigas afastam os espectadores de hoje.

Então, com a clara intenção de cativar esse espectador moderno, fomos brindados com esta nova versão que tem muitos méritos e serve como um “complemento” ao filme original.

Creio que os antigos fãs não se decepcionarão com este longa-metragem.

A trama.

Bem, caso você nunca tenha visto o filme original ou lido o livro, certamente tem dúvidas sobre qual é o real conteúdo da obra. Papillon conta a história de Henri Charrière (interpretado por Charlie Hunnam), um ladrão que foi acusado de assassinato na França, cujas leis, à época, determinavam o cumprimento da pena na Guiana Francesa.

Durante a viagem, Papillon (apelido de Henri) faz um acordo com Louis Dega (Rami Malek), um rico golpista que é incapaz de se manter vivo no novo e inóspito ambiente.

Unidos pelo desespero e a vontade de fugir, eles conhecem novos presos, presenciam assassinatos e têm a fé testada diante da solidão, do medo e tortura.

Esta é uma jornada que já inspirou gerações e, novamente, surge para trazer uma excepcional lição à geração atual.

Protagonistas.

Papillon (Charlie Hunnam) e Dega (Rami Malek) estão impressionantes. Alguns tentarão comparar seus trabalhos aos dos atores da primeira versão, porém considero isso desnecessário.

Nesta nova e bela obra os atores incorporam com muito talento seus personagens. Acreditamos em suas motivações e os acompanhamos na jornada de dor e redenção.

Os demais componentes do elenco servem como base às atuações deles, com especial destaque ao diretor do presídio, interpretado pelo ator Yorick van Wageningen. Julot (Michael Socha) e Celier (Roland Møller) são outros destaques.

Ambientação e trilha sonora.

A prisão foi reconstituída em seus mais sutis detalhes. Com uma linda fotografia e locações que oscilam entre o belo e o claustrofóbico, gostei muito do resultado e do esforço da equipe de produção para trazer à tela o opressor ambiente do cárcere na Guiana Francesa.

Muitas cenas ganham força com a competente trilha sonora. Outras, por sua vez, são impressionantes pela ausência de som, remetendo ao isolamento de uma solitária.

Loucura.

O longa-metragem mostra a luta da dupla Papillon e Dega para fugir da Guiana. A cada tentativa (e falha), suas vidas perdem qualidade. O esforço de Charrière para sair de lá ganha ares de um trabalho hercúleo, principalmente se levarmos em consideração todas as torturas pelas quais ele é submetido quando pego.

Quando o espectador contemplar e refletir sobre essa vontade de permanecer vivo – sobretudo o desejo de permanecer longe da loucura – terá com certeza um momento de iluminação, pois é impossível ficar incólume ao medo, sofrimento e abandono dos personagens, ainda que eles sejam bandidos e estejam pagando por seus erros.

O decorrer da trama mostra uma perda (talvez sutil) da sanidade, mas jamais veremos a perda da esperança. Essa é uma boa lição passada pela história de fé e perseverança de um homem que não se deixa abater pelos castigos e todo o mal que o cerca. Isso está bem caracterizado pelo envelhecimento gradual e uma maior compreensão dos personagens sobre o que devem fazer para não morrerem.

Certo ou errado, cabe a você que lê esse texto dizer. O que eu enxerguei durante todo o filme foi a mensagem de que somos fortes, somos perseverantes e, sobretudo, a mensagem que reafirma o ditado “não há mal que sempre dure”.

A loucura pode tentar abraçá-lo, mas só você pode decidir se retribuirá o abraço ou não…

A direção.

Michael Noer fez um trabalho muito bonito ao dirigir Papillon. Diante dos prováveis temores ao fazer um remake, a pressão por dar novamente vida a um clássico da literatura e ainda as muitas cobranças dos críticos e imprensa, é possível vermos uma obra feita com muito capricho e respeito pelo espectador.

Na verdade, vejo essa nova versão de Papillon como uma ponte para a obra cinematográfica original (o que permitirá que o público de hoje busque o filme de 1973) e também servirá para trazer novamente à pauta o livro escrito por Charrière, cujas descrições e conteúdo são certamente mais impactantes.

Sob tais aspectos, resta apenas parabenizar o diretor por homenagear o filme original com muitas passagens similares, mas também por não produzir apenas uma cópia. Para isso foi necessário ter coragem, já que ele não optou pelo óbvio.

Eu recomendo muito que assistam a ambos os filmes (com especial atenção para essa nova versão que já está nos cinemas). Ler o livro publicado aqui pela Bertrand Brasil também ampliará o alcance da história que está há décadas nas mentes de várias gerações.

Nada dura tanto se não tiver muita qualidade.

Bom filme a todos. Boa leitura!

 

Mais do NoSet

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *