Camelot 3000. Resenha da consagrada graphic novel de Mike W. Barr e Brian Bolland.

Uma das séries responsáveis pela reformulação no modo como se faz quadrinhos, fruto de uma safra de verdadeiras obras de arte: assim é como defino Camelot 3000.

Escrita por Mike W. Barr e ilustrada por Brian Bolland (A Piada Mortal), esta trama foi publicada originalmente em formato de maxissérie. No Brasil, ela foi lançada inicialmente nas revistas Super Amigos e Batman, mas houve outras edições em formato de minissérie e também em edições encadernadas.

Entretanto, não importa qual seja a forma de publicação, Camelot é uma obra-prima dos quadrinhos e merece ser lida. Os motivos? Descubram agora…

MITOLOGIA E QUADRINHOS

Camelot 3000 é uma HQ diferenciada. Seu conteúdo mistura a lenda do rei Arthur e a Távola Redonda com a ficção de um futuro alternativo. No roteiro de Mike Barr, o rei Arthur ressurge para, novamente, auxiliar a Inglaterra a recuperar o caminho correto. Contudo, nesse contexto há um detalhe de extrema importância: Arthur é o único integrante da Távola que conhece o próprio passado e está ciente de quem realmente é. Tal qual na lenda arthuriana, o surgimento do rei implica em renovação espiritual para todos os súditos. Pelo menos para os que creem.

ARTHUR E MERLIN

O vínculo entre o rei e a magia ainda permanece. Arthur é despertado de um longo sono e descobre que vive em um novo e agonizante mundo. É neste contexto que a busca pelos antigos integrantes da Távola Redonda se inicia, mas com um ponto negativo que é a ausência de alguns dos cavaleiros. Com a ajuda de Merlin, o filho do Demônio, os cavaleiros são ‘despertados’ de uma vida onde estavam desligados de seu passado. A magia é a principal responsável por um início menos propenso à derrota por parte do rei e seus asseclas.

A TRAIÇÃO

Caso você ainda não tenha lido sobre as lendas arthurianas, o que vou dizer é um SPOILER de nível nuclear…

Arthur tem uma rainha consorte chamada Guinevere. Essa rainha é o alicerce sentimental do rei e ela trai a confiança e o amor dele com seu mais confiável cavaleiro, Lancelot. Esse triângulo amoroso é a ruína para Arthur e, infelizmente, nem mesmo a reencarnação foi capaz de apagar a atração mútua entre a rainha e Lancelot. Logo, a trama de Barr já começa com um ponto extremamente negativo (para o Rei), um ponto fraco que pode decretar a derrocada da nova Távola.

 ALIANÇAS IMPROVÁVEIS

Um dos pontos altos da história são as alianças formadas pelos mais improváveis aliados. Motivados por prazer, rancor, medo ou poder, os grupos vão ganhando força conforme a trama se desenvolve. Mas não são essas alianças por si só que dão um realce à trama. São as nuances e surpresas nesses grupos (incluindo múltiplas traições) que reforçam o impacto do drama e mostram que essa não é uma história comum.

OUTROS PONTOS ALTOS DA TRAMA

Mike W. Barr nos presenteou com um roteiro adulto, enxuto e coerente. A trama tem política, sexo, violência, corrupção e uma visão futurista apocalíptica onde a Inglaterra e todo o planeta estão à mercê dos desígnios de alienígenas que matam indiscriminadamente e não mostram piedade. Entretanto, isso pode esconder muito mais, principalmente se levarmos em conta as lideranças desses invasores.

Outro ponto polêmico é a abordagem da reencarnação. A Távola é reconstruída com os mais diferentes cavaleiros e há um caso onde um deles retorna como mulher. Barr dá um tratamento muito interessante a essa integrante dos cavaleiros e mostra os conflitos psicológicos por ela sofridos. Como um homem pode viver no corpo de uma mulher sem enlouquecer? Essa é uma das muitas questões abordadas na obra.

A RELIGIÃO

Mesmo se tratando de uma visão futurista do mundo, a religiosidade ainda está presente. Aliás, é a fé que se mostra capaz de incentivar mudanças de comportamento e também é a fonte de força de Arthur.

Uma das partes mais emocionantes da trama acontece na busca pelo Graal, fato que, inclusive, precisa de uma fé inabalável para que seja encontrado.

O FUTURO

A obra de Bolland e Barr tem um visual datado. As imagens são magníficas (basta citar as consagradas artes de A Piada Mortal), mas é perceptível que for am feitas com base em toda a visão da época (década de 80) sobre um futuro que não condiz com um provável ano 3000, o que não desmerece a graphic novel de forma alguma.

Como dito acima, o que surpreende é a presença de uma dose de religiosidade (cristã) que parece improvável quando olhamos para a realidade, principalmente quando notamos um  crescimento vertiginoso de outras religiões.

PARÁBOLAS

Há algumas lições embutidas de forma bem  discreta e outras nem tanto. Entretanto, o eterno duelo entre o bem e o mal ganha uma dimensão diferente quando o assunto é o destino de Morgana Le Fay. Ela paga um alto preço por seu poder e é essa associação entre poder e desgraça que dão um tom dramático intenso à personagem.

Outra visão interessante está em Sir Percival que é representado como um monstro em aparência, porém é o cavaleiro com o coração mais puro.

Por meio de tais representações e  conflitos, Barr e Bolland dão um raro presente ao público leitor, mesclando fé,  castigo e amor em uma trama plena de reviravoltas e ensinamentos.

EDIÇÕES DE LUXO

O leitor que comprou a edição de ‘luxo’  da Mythos certamente se arrependeu ao encontrar – anos depois – a Edição Definitiva da Panini. As duas tem quase o mesmo conteúdo, porém a edição da Panini tem extras, capa dura e impressão em papel couchê.

Definitivamente, recomendo a aquisição da edição de luxo (de verdade) da editora Panini, mesmo com seu preço maior.

Entretanto, se você só quer realmente  ler a história e jamais tê-la outra vez em mãos, busque as 4 edições que são facilmente encontradas em sebos e na web.

NOTA FINAL

Preciso falar? Camelot 3000 é uma das  melhores tramas dos anos 80 e que ainda está atual em nossos dias. Dou nota máxima e afirmo: arrependei-vos, vós que não lestes tal obra.

Mais do NoSet

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *