É amor! E agora?

Não é que ele fosse o homem mais bonito do mundo, estava bem longe disso. Nem mesmo suas mãos eram tão bonitas quanto eu gostaria que fossem. Eu observo as mãos de uma pessoa antes de qualquer outra coisa. Mãos revelam quase tudo sobre a vida de alguém. Se trabalha com papéis, com máquinas pesadas, ou até mesmo se não faz absolutamente nada. As mãos dele eram finas, mãos de alguém que de alguma forma pega em outras mãos. Misterioso? Quem sabe!

Entretanto o que mais me cativou não foram suas mãos, mas seu sorriso, poli-dental, lindo, quase que alcançando as extremidades de suas orelhas. Era o sorriso mais lindo que eu já havia percebido em um homem. Depois do sorriso, as mãos poderiam deixar de ser um requisito. Mas elas também tinham seu charme, sua delicadeza. Unhas bem aparadas, os dedos não eram muito longos, nem muito curtos, a pele, cor de leite com algumas gotinhas de café, faziam com que fossem ainda mais doces. Eu sei que ninguém adjetiva uma mão como “doce”, mas aquela era. Doce.

Ele estava sentado sozinho na mesa ao lado da minha, havia pedido café com creme, meu preferido, e sem açúcar. Diferente de todos os outros homens não acompanhados daquele lugar, ele não mexia de forma frenética no celular, motivo pelo qual pude perceber suas mãos com tantos detalhes. Tinha olhos castanhos bem escuros, sobrancelhas marcantes e seus cílios eram longos e muito bonitos, realçavam os olhos grandes que ficavam ainda maiores quando sorria. Não era daqueles caras com o corpo definido, tinha até uma barriguinha desproporcional ao corpo magro, mas, como disse antes, o sorriso ia dando os descontos de todo o resto.

Soprou um vento forte, repentino, como é de costume nessa época do ano aqui em Waterloo, cidade pequena nos arredores de Toronto, no Canadá, de onde escrevo em meio ao frio. Aquele vento me arrepiou, o cachecol que estava sobre a mesa voou, foi cair justamente sobre a mesa do estranho de sorriso lindo e mãos doces. Ele sorriu, pegou o agasalho e veio de encontro a minha mesa. Coração realmente não aceita ordens, não raciocina com lógica, apenas se apaixona, bate forte, ameaça sair pela boca, anula as sinapses do cérebro e tenta dominar seus braços para agarrar a pessoa amada. Mas não, eu não permiti, e me comportei como o cavalheiro que sempre fui. Bem, nem sempre, mas depois conto essa história. Ele era lindo mesmo. Tudo bem, não era assim, lindoooo, mas o sorriso e tudo mais, bem, ele disse que estava começando ventar e que seria melhor se entrássemos para o interior do café onde estávamos. Consenti com a cabeça e entramos.

No interior do café ele pôs educadamente o cachecol ao redor do meu pescoço, ao que puxara a cadeira para que eu pudesse me sentar, vi que sua delicadeza estendia-se para além de minha adjetivação. Além de lindo, sorridente e com mãos doces, ainda havia espaço para ser cavalheiro. Já estava enlouquecido, travando dentro de mim uma briga descomunal que me fazia ir do tudo ao nada várias vezes, enquanto observava sua boca, seus olhos e claro, suas mãos. Ele perguntou meu nome, eu pensei mais de dez segundos para responder, tal qual um menino bobo do colegial num encontro com seu primeiro par para o baile.

Ele nem era meu namorado, eu nem mesmo o conhecia. Respondi que me chamava Gustavo, minha vós estava trêmula, mas tudo bem, ele pensaria que foi por conta do vento frio e repentino, mas era medo mesmo, pavor, amor, sei lá o que mais passava-se por minha mente. Ele me disse que como não havia perguntado o nome dele (nossa como sou idiota), ele me diria assim mesmo, ao que em forma de uma sinfonia de Beethoven ele pronunciou: “…me chamo, Anders, Anders Lincoln”.

Seria a reencarnação de Abraham Lincoln? Poderia ser. Eu estava ficando louco. Disse a ele que seu nome era lindo! Idiota! Não falei lindo, como todos falam: “nossa que roupa linda”, ou “como seu relógio é lindo”, saiu algo como a vós sexy da moça que fala nos alto-falantes do aeroporto, “Que nooome liindooo”, mais ou menos assim.

Ele muito gentil agradeceu, me contou que na verdade não gostava muito de seu nome. Claro que não gostava, só eu para gostar e ainda elogiar um nome como “Anders”, mas naquele ponto eu sabia que precisava ir embora dali rapidamente, mas jamais poderia fazer isso sem arrancar o telefone ou endereço completo dele. Eu jamais me perdoaria.

Quando conheci um carinha no colegial e não perguntei o nome, ele foi embora da escola e nunca mais o vi, estava apaixonado por ele até o dia da formatura, então dessa vez eu faria diferente: pediria o telefone dele caso as tentativas de agir como um gato querendo atenção de seu dono não viessem a dar certo. Disse a ele que havia adorado a companhia, mas que precisava ir embora (senão me atiraria em seus braços e lhe beijaria como se fosse o último homem do mundo), ele sorriu (de novo), eu sorri de volta, como um retardado, quase que uma baba escorreu pelo canto da minha boca, então me recompus imediatamente, bebi o resto do café, e como ele estava me olhando, não passei o dedo no creme que fica nas bordas, e não me julguem, todos fazem isso quando ninguém esta observando.

Ele levantou-se, e com um ar quase que aristocrático e ao mesmo tempo tímido de menino, pediu se pareceria ousadia demais pedir meu telefone, mal sabendo ele que eu gostaria é de lhe dar meu endereço, a chave de minha casa, por seu nome na conta bancaria ao lado do meu, mas novamente me contive e respondi que não, eu adoraria marcar um programa. Programa? Prostitutas marcam programas, quem é que disse isso? Meu Deus estou louco mesmo. Mas consertei rapidamente, dizendo um café, uma bebida, teatro… Ele sorriu (sim, de novo!), eu sorri, dei meu cartão, ele apertou minha mão, eu rezei para que ele me agarrasse, beijasse, me levasse para a suíte de hotel mais próxima, mas claro que um cavalheiro jamais faria aquilo. Ele me recomendou prender bem o agasalho por causa do vento e prometeu ligar no dia seguinte para combinarmos um programa. Ai meu Deus!

O encontro, você confere na próxima semana! Foi lindo!

*Você pode não concordar. Mas respeite a diversidade. Este texto é ficção, qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.

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