Crítica: Tudo e todas as coisas

Histórias sobre amores impossíveis estão na base da literatura e, por consequência, do cinema ocidental. São um modelo com o qual quase nos identificamos, em menor ou maior grau, tendo como exemplo máximo o clássico Romeu e Julieta.

Tudo e todas as coisas, baseado no livro Everything, Everything de Nicola Yoon lançado em 2015, está inserido nessa tradição romântica: é um filme sobre o amor impossível. Mas não só isso. Na última década, o cinema e a literatura fizeram um subgênero específico: o dos adolescentes apaixonados que vivem sob a sombra de alguma doença ameaçadora. Estão enquadrados nele, por exemplo, Eu, você e a garota que vai morrer e A culpa é das estrelas.

Em Tudo e todas as coisas, Maddie (Amandla Stenberg) é uma mulher bonita e inteligente, que completa 18 anos sem ter saído de casa, frequentado o colégio, tido um grupo de amigos ou mesmo encostado em algum menino. Diagnosticada pela mãe e médica Pauline (Anika Noni Rose) como portadora de imunodeficiência combinada grave (IDCG), Maddie não pode se expor a qualquer agente infeccioso, pois não possui os linfócitos T e B. Tudo na casa onde vive, e que acaba por se tornar a sua prisão de luxo, é esterilizado. O acesso é restrito à mãe, à filha, à enfermeira Carla (Ana de la Reguera) e à filha desta, Rosa, a única menina com quem Maddie tem algum contato (Danube R. Hermosillo).

A rotina de Maddie de estudo à distância, leitura e navegação na Internet é interrompida quando Olly (Nick Robinson) se muda com a família para a casa ao lado. Os dois veem-se brevemente pela janela e acabam por se tornarem amigos depois de insistentes tentativas de contato do garoto. Daí para a paixão foram apenas algumas mensagens de texto a mais.

Com a paixão, como sempre, vem a confusão. A rotina perfeita de Maddie é abalada pelo desejo de estar com Olly. O garoto, por sua vez, tem seus próprios problemas com o pai, um bêbado violento que ameaça a família.

O filme não se perde em detalhes. A narrativa é dinâmica, fluente e agradável. E, exatamente nesse ponto, reside o seu principal problema. Olly e Maddie são personagens agradáveis demais. Os dois personagens têm pouca profundidade, se considerarmos os problemas que enfrentam. Para alguém que permaneceu toda a vida encarcerada em casa, mesmo com todas as facilidades que o dinheiro, o carinho da mãe e a tecnologia podem propiciar, Maddie é artificialmente centrada, bem-resolvida e feliz. Mesmo nos momentos em que está prestes a “explodir” em seu aprisionamento, Amandla Stenberg não consegue nos transmitir verdadeira angústia. Já Olly não deixa transparecer como o ambiente conturbado em sua casa o afeta. Há, por exemplo, uma cena dramática de enfretamento com o seu pai, mas nenhuma consequência em Olly é mostrada. Logo em seguida, ele aparece sorrindo em outra cena.

Há uma clara tentativa de preservar o público de qualquer emoção negativa mais explícita. É como se o roteirista nos dissesse: “Vocês sabem o que está acontecendo, então não precisamos mostrar, ok?”. O problema é que, sem grandes atuações para deixar à mostra esses pedaços ocultos da história, o resultado fica superficial.

O melhor desempenho é de Anika Noni Rose. Pauline perdeu o marido e o outro filho em um acidente de carro e faz todo o possível para preservar a vida da filha que lhe restou. Ela é a personificação de um desejo contra o qual devem lutar os pais, de isolar os filhos do mundo, preservando-os de todos os males, ao invés de prepará-los para a vida. Pauline não tem muitos minutos de tela, mas, quando aparece, domina a cena.

O filme trabalha bem com símbolos, como o do astronauta – figura utilizada por Maddie em suas maquetes de estudo de arquitetura – que com sua roupa de passeio espacial transmite a forma como a menina se sente apartada do mundo. Maddie é, ainda, a típica figura da princesa presa na torre e distante do seu cavaleiro que tudo faz tudo para resgatá-la. Mais uma herança da tradição romântica, que é objeto, inclusive, de brincadeira nas conversas de ambos. É interessante notar, também, a mudança nas cores das roupas dos personagens principais de acordo com a evolução da personalidade de cada um.

A trilha sonora, como em todos os filmes do “subgênero”, é boa, privilegiando o folk e o pop. Há fotografia é correta, mas não um ponto de destaque.

Tudo e todas as coisas é um drama adolescente leve, que entrega o que promete e não vai decepcionar o seu público alvo.

Tudo e Todas as Coisas é estrelado por Amandla Stenberg (“Jogos Vorazes”), como Maddy, e Nick Robinson (“Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros”), como Olly. Também estão no elenco Ana de la Reguera (“Sun Belt Express”) e Anika Noni Rose (“Dreamgirls: Em Busca de um Sonho”). A diretora Stella Meghie dirige o emocionante drama romântico a partir do roteiro adaptado por J. Mills Goodloe (“A Incrível História de Adaline”). Leslie Morgenstein e Elysa Dutton assinam a produção pela Alloy Entertainment; a Alloy também é responsável pelas populare séries de TV “Gossip Girl”, “Pretty Little Liars” e “The Vampire Diaries”. Victor Ho é o produtor executivo.

A talentosa equipe de criação conta com a direção de fotografia de Igor Jadue-Lillo (“Minhas Mães e Meu Pai”); a desenhista de produção Charisse Cardenas (“Sniper Americano”); a editora Nancy Richardson (“Divergente”, “A Série Divergente: Insurgente”); e a figurinista Avery Plewes (“Jean of the Joneses”). A trilha sonora é composta por Ludwig Göransson (“Um Espião e Meio”, “Creed – Nascido Para Lutar”).

Ficha técnica:
Título original: Everything, Everything
Gênero: Drama/Romance
Distribuidora: Warner Bros.
Elenco: Amandla Stenberg, Nick Robinson, Anika Noni Rose e Ana de la Reguera
Direção: Stella Meghie
Ano: 2016
Duração: 97 min

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