Crítica | A Grande Mentira

É comum nos depararmos em jornais ou via boca a boca notícias de gente caindo nos mais diversos tipos de golpes. Desde antigos como o do bilhete premiado, onde a ambição e a ingenuidade da pessoa a fazem perder somas consideráveis, a jogos em que o golpista esconde a bolinha em um dos três copos, onde a vítima sempre acaba perdendo. E existem golpes novos, como devido à falsa ilusão de que os filhos podem ser famosos modelos, mães acabam pagando caro por um punhado de fotos e contratos falsos. Idosos também são lesados com ideia de que podem fazer um book fotográfico, sendo que no fundo por apenas umas três fotos, o lesado acaba pagando o que não tem. No meio dos sites de relacionamentos também é comum pseudo namorados explorarem e tirarem a grana de jovens ou senhoras solitárias iludidas por acharem que encontraram seu grande amor. E com o tema de um grande golpe que começa no mundo virtual, Bill Condon dirige A Grande Mentira (The Good Liar), baseada no livro de mesmo nome.

A história começa com Roy Courtnay (Ian Mc Kellen) que conhece em um site de relacionamentos virtuais Betty Mc Leish (Hellen Mirren). Ele é um grande golpista disposto a conquistar e rapinar a pobre e calejada viúva com consideráveis posses. Roy tem certeza de que achou a mina de ouro que pode dar a ele tranquila aposentadoria. Pouco a pouco também descobrimos que Roy é mais que um simples explorador de senhoras e sim um perigoso de um golpista que não tem medo de usar métodos com muita persuasão e violência para seus trambiques. Mas o convívio quase de casal entre eles faz com que ele até simpatize com a doce e às vezes ingênua Betty. Conforme seu plano está se encaminhando para dar certo um passado nebuloso e mal resolvido paira sobre a dupla.

Bill Condon já dirigiu bons filmes como Deuses e Monstros (God and Monsters, 1998), Dream Girls – em Busca de um Sonho (Dreamgirls, 2006), flertou com o comercial com filmes da série Crepúsculo e agora nos apresenta a sua adaptação do recente best-seller A Grande Mentira, de Nicholas Searle. O livro é um emaranhado de situações e reviravoltas e passá-lo para a grande tela não era uma missão fácil. Infelizmente o filme, principalmente o roteiro adaptado por Jeffrey Hatcher, é insuficiente e não dá conta de tantas surpresas, apelando pelo didatismo para explicar certos porquês da história. Se como Condon mesmo disse, queria fazer um filme ao estilo Hitchcock, ele acaba sim passando bem longe disso. Enquanto o mestre inglês fazia com que o espectador, através de muito mistério e suspense, tivesse as pistas para desvendar os segredos das tramas, em A Grande Mentira nada fica óbvio e as diversas lacunas e dúvidas tornam impossível esse exercício detetivesco. Na parte técnica do filme há de se destacar a bela montagem que tenta dar certo sentido a algumas situações, o que é um dos poucos acertos técnicos do longa.

Mas realmente o que segura e faz valer a pena conferir o filme é a união de dois monstros do cinema: a oscarizada e genial Hellen Mirren brilhantemente no papel de Betty e Ian Mc Kellen como o golpista de passado obscuro Roy. Os dois brilham intensamente, é um deleite ver dois atores já com uma avançada idade em grande forma numa sintonia fina rara, esbanjando charme, talento e classe típica britânica. Se algo vale o ingresso é o jogo de gato e rato que o casal proporciona nas telas. Lembra, pra quem gosta de cinema, as atuações fantásticas de Laurence Olivier e Michael Caine no clássico Trama Diabólica (Sleuth, 1972). Como no filme de 1972, existe um grande desafio de esperteza recheado de reviravoltas e muita dissimulação.

Infelizmente, apenas a atuação fantástica do casal protagonista não conduz sozinha a trama que, não posso deixar de ressaltar, tem um surpreendente desfecho, porém devido a uma direção engessada e um roteiro que precisa quase sempre ser explicado fazem de um filme com um potencial enorme, se tornar um mero entretenimento – deixando claro que é longe de ser um filme fraco, mas que pelas expectativas deixam o espectador um pouco decepcionado. Resta saber se o Oscar vai lembrar alguém da dupla de atores nas indicações já que o filme veio com uma expectativa e foi lançado em uma época boa para almejar prêmios, pois acredito que a única esperança de premiação vem da acertada e genial dupla de atores.

Sinopse: O golpista Roy Courtnay (Ian McKellen) mal consegue acreditar em sua sorte quando conhece a viúva endinheirada Betty McLeish (Helen Mirren) online. Quando Betty abre sua casa e vida para ele, Roy fica surpreso ao perceber que está se afeiçoando a ela, transformando o que deveria ser somente mais um golpe na corda bamba mais traiçoeira de sua vida.

Elenco: Helen Mirren, Ian McKellen, Russell Tovey, Jóhannes Haukur Jóhannesson, Jim Carter, Mark Lewis Jones, Michael Culkin, Phil Dunster, Laurie Davidson, Aleksandar Jovanovic, Jacqueline Ramnarine

Direção: Bill Condon, o roteirista vencedor do Oscar por Deuses e Monstros, dirigiu e produziu o filme a partir de um roteiro de Jeffrey Hatcher (Sr. Sherlock Holmes), baseado no aclamado livro de Nicholas Searle.

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