A Casa do Medo (Incidente em Ghostland): boa combinação de loucura e terror baseada em H.P. Lovecraft.

O que diferencia um filme de terror antigo da esmagadora maioria dos filmes do mesmo gênero nos tempos atuais? Acredito que seja a paciência em produzir um longa preocupado em mostrar ao público um medo mais real, distante dos formatos atuais que se valem quase que exclusivamente do “jump scare”. Essa é métrica reinantem em A Casa do Medo – Incidente em Ghostland, obra que, entre outra coisas, serve como homenagem direta ao escritor Howard Phillips Lovecraft (ou simplesmente H. P. Lovecraft), um dos maiores nomes do gênero terror, responsável por inspirar incontáveis obras. Lovecraft é tão importante que marca o trabalho de Neil Gaiman e Stephen King, apenas para citar.

O que é a Casa do Medo?

O título original faz referência a uma obra literária fictícia chamada Incident in Ghostland, cuja autora é a bem sucedida Beth (Crystal Reed). Teoricamente, o livro é inspirado em um acontecimento que ocorreu há anos com Beth (Emilia Jones), sua irmã Vera (Taylor Hickson) e a mãe delas Colleen (Mylène Farmer) quando foram atacadas por uma dupla de assassinos seriais.

O drama retorna quando Beth recebe um pedido de ajuda de sua mãe, obrigando-a a retornar ao mesmo ambiente onde ela e o restante da família quase foram assassinadas. Fora o problema de estar distante do filho e do marido, Beth terá que conviver com a solidão que atinge a mãe, além da loucura que se apossou de Vera depois do ataque dos matadores.

De volta a esse ambiente sombrio e triste, Beth terá que ajudar a mãe a salvar o pouco que resta de sanidade de Vera, mas há outras coisas na casa que parecem não querer que isso aconteça.

A sombra e a escuridão.

O longa-metragem passa a nos conduzir por uma trama cada vez mais estranha. O espectador passa a questionar qual é a realidade em que Beth e Vera se encontram, pois os delírios ganham força e nos levam a duvidar da sanidade delas. Ponto para o roteiro e a direção que cumprem com seu papel e plantam a cada segundo a semente da desconfiança.

Há momentos em que o público se questiona sobre a sanidade da mãe, Colleen. Em outros, especula-se a existência de espíritos. Mais ainda, a todo instante tem-se a nítida impressão de que as meninas estão loucas, sequeladas pelo trauma.

Em meio a essa gama de opções, a confusão é instaurada e isso nunca permite que o público saiba o que realmente ocorre. Entre a alegria de Beth em sua vida ao lado da família que constituiu e o horror do cárcere ao lado da mãe e a irmã, cercadas por entidades que as atormentam, aos poucos é possível contemplar o que realmente está ocorrendo, tal como nos ótimos contos de H. P. Lovecraft.

O mal tem sentimentos.

Os dois serial killers da trama nutrem um apreço mútuo. São como mãe e filho, sempre com a mulher magra defendendo o gigante gordo. Há uma macabra parceria entre eles, um pacto onde o medo do gigante só se aplaca com a ajuda da magérrima criatura de preto. Em uma espécie de pacto, os dois se nutrem do medo, do sangue e carne de suas vítimas.

As passagens onde os serial killers aparecem são muito fortes. Acontece desde o espancamento até uma prévia de estupro. A dupla Beth e Vera sofre como se isso fosse um castigo infernal, uma verdadeira tortura oriunda de um recanto bem profundo no inferno.

O interessante disso está na busca pela saúde do gigante. A mulher magra aparenta conhecer bem a mente do gigante e aquilo que o controla. Eles são, resumidamente, a mente e a força de uma dupla voltada apenas para a imposição da dor.

Interpretados por Kevin Power (a mulher magra) e Rob Archer (o gigante gordo), essa dupla conseguiu trazer o medo e a repulsa em cenas memoráveis. Eles nos lembram de uma coisa: o sobrenatural pode assustar, mas apenas humanos têm o poder de realmente matar.


A Direção.

Dirigido e escrito por Pascal Laugier, A Casa do Medo ganhou mais impacto por conta das acertadas escolhas de alternância entre realidade e um mundo criado para que a sanidade não fosse perdida. Esse refúgio está bem estruturado e confunde propositadamente o espectador que fica em dúvida até o final sobre o que é realmente o nosso mundo e o que é fruto do medo.

A opção de não pôr muitos jump scares é outro acerto, pois tirou esse longa do caminho que muitas produções atuais optaram. Ao voltar para um terror mais psicológico, Pascal obteve um ótimo resultado final, capaz de causar incômodo e tensão durante toda a projeção do filme.

Família.

Entre tantas outras pequenas lições ao longo do filme, Pascal Laugier deixa um belo recado à plateia: uma verdadeira família deixa de lado as diferenças quando a união é a única solução para os problemas que surgem. Apesar das irmãs não serem “melhores amigas”, as dificuldades e a necessidade de permanecerem vivas são elementos suficientes para que esqueçam as diferenças e fiquem unidas, para o bem ou para o mal.

Certamente elas teriam a sanidade destruída, caso uma ruísse.

Notas finais.

O filme consegue aquilo que esperamos de uma produção de terror: tensão, medo, personagens sombrios, a propagação da dúvida, sustos…

É claro que há algumas passagens “clichês”, porém isso não diminui o impacto da obra ou atrapalha o ritmo narrativo. Bem dirigido e com boas atuações, essa produção está acima no quesito qualidade de filmes como A Freira (extremamente divulgado) e outros similares.

Recomendo por sua interessante trama, baseada no estilo de escrita de Lovecraft que, inclusive, tem uma pequena participação na história.

Bom filme a todos!

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